R ecentemente, temos ouvido muito a palavra narrativa, sempre com o sentido de história contada, ajustada ao interesse de quem conta, usando, para isto, até mentiras ou fazendo malabarismos com a “verdade” para defender posicionamentos. É lamentável vermos uma espécie de institucionalização destas narrativas, mais precisamente de mentiras como instrumento de convalidação de argumentos para apoio de ideologias. Todas essas questões me remetem ao Sofismo ou sofisma que tem conceituação em um pensamento ou retórica que procura induzir ao erro, com afirmações aparentemente lógicas e apresentada com um certo sentido, mas as suas bases trazem a má-fé, o objetivo de engar. As habilidades dos sofistas faziam com que o interlocutor acreditasse plenamente no que era falado, sendo verdade ou não.
Vemos atualmente tais discursos sendo amplamente e sem constrangimento feito entorno das vacinas, mas recentemente das vacinas para crianças. Mais de 30 países já estão em franca vacinação em crianças, inclusive o Brasil, sem registo efetivo de efeitos adversos do esperado. É triste vermos defesas de inverdades usadas com argumentações supostamente apresentadas como legítimas e científicas, mas sua real intenção reside na ideia do erro, motivado por um comportamento capcioso, numa tentativa de enganar e ludibriar, a fim de prevalecer ideologias. Muito triste tudo isso.
Nesses casos em comento, ou seja, a difusão de dúvidas por força de interesses inconfessáveis, certamente está levando a pais se perderem em suas responsabilidades de proteção do que eles sempre usaram para fazerem seus filhos terem saúde. Tudo isso me faz lembrar de Otelo, o Mouro de Veneza, uma das mais comoventes tragédias shakespearianas. Uma peça que estreou em 1604 e levou para os palcos um casamento inter-racial, ciúme, racismo... No enredo, Otelo é um general mouro a serviço do reino de Veneza, casado com Desdêmona, moça de pele clara e filha de um rico senador. Surge na trama Iago, que com interesses sombrios e motivado sempre por inveja, cria uma rede de intrigas e mentiras que fazem Otelo acreditar que está sendo traído por sua esposa. Tudo sem proas, apenas insinuações, dúvidas, mentiras que vão envolvendo o protagonista, que chega ao ponto de matar a sua esposa e depois cometer suicídio. Em dimensão da lógica e do que se tem como verdade científica, a desconsideração de estudos especializados chega a ser criminosa, uma semeadura de mentiras que só serve a interesses inconfessáveis e acolhimento por parte de corações abertos que se sentem convencidas pela retórica sofista.
Talvez o pior de tudo isso seja exatamente a colocação de pequenos e indefesos em linha de frente de perigosos jogos de política e poder.
José Medrado Mestre em família pela Ucsal e fundador da Cidade da Luz medrado@cidadadaluz.com.br