A borto sempre foi um tema espinhoso e difícil de se debater, haja vista que pelo viés religioso não há como fazer qualquer posicionamento discursivo sobre o tema, nem falo em posicionamento a favor. A verdade é que pessoa alguma, e digo com segurança, é a favor do aborto, pura e simplesmente, porém a questão é muito mais ampla e complexa do que a conceituação ou posicionamento religioso, ou mesmo jurídico de ser crime ou não, pois ele também se reflete em consequência, em vários casos, de um crime, como no de estupro. É preciso, no entanto, verificar outro aspecto, como a dor moral da mulher, que pude se eternizar enquanto ela viver. A pauta da Comissão dos Direitos da Mulher da Câmara dos Deputados está com pauta, se não houve mudança, para esta quarta-feira (13) para se discutir o projeto de lei que cria o chamado Estatuto do Nascituro, que está na Câmara desde 2007. A pressa, inclusive sem maiores discussões com a sociedade, é para dificultar e endurecer a punição ao aborto no Brasil ainda nesta legislatura. As alterações visam reconhecer o nascituro como pessoa, consequentemente garantir os direitos desta pessoa e criminalizar as três formas de aborto permitidas atualmente (estupro, feto anencefálico e quando a vida da mulher correr risco), tornando-as como crime hediondo, englobando ainda novos tipos penais como o aborto culposo, apologia ao aborto e a proibição de informações ou imagens depreciativas ou injuriosas à pessoa do nascituro. Em verdade, o texto para votação proíbe a autorização do aborto no caso de anencefalia, não ficando às claras as outras duas formas, isto porque já previstas no Código Penal de 1940. A preocupação nesse caso será com as interpretações jurídicas da possível nova norma. Reportei-me acima que a questão vai muito mais além de ser contra ou a favor, pois me lembro nitidamente quando em 2016 um crescimento enorme de crianças nascidas com anencefalia dominou os jornais brasileiros, e pude constatar com algumas dessas mães que deram à luz a crianças com esta patologia, o seu enorme desespero, geralmente em relação ao futuro, como seriam cuidadas, os empregos, as rendas familiares?! Era muita angústia. Queriam garantir ajuda. O Estado, entendo, não pode simplesmente deliberar sem respaldar as suas decisões, crendo que todos podem arcar com elas. Não tenho informações sobre todas, mas soube que duas dessas crianças morreram antes de completarem um ano. As políticas públicas não podem deliberar sem gerir consequências, compreendendo que a clandestinidade, in casu, sempre será buscada para as mulheres de nossas bolhas, mas as pobres sofrerão o abandono típico da indiferença dos que só querem ficar bem com os conceitos dos seus tidos iguais.
José Medrado Mestre em família pela Ucsal e fundador da Cidade da Luz