F oi um choque mundial, o Dalai Lama ter pedido a uma criança que beijasseasua boca. O menino estranhou. Vamos ficar aqui. Naturalmente, as manifestações de repúdio surgiram, bem como as tentativas de justificar, em geral se apoiando em que ele é brincalhão. Como brincalhão? Não se tratava de um adulto, mas de uma criança. É sabido que muito se fala da privacidade de certos líderes religiosos, principalmente as suas peripécias e crimes sexuais. Tomando-as como calúnias, difamações, mas quando o fato é um vídeo, não um deepfake, nem algo editado, mas ali em sequência normal! Difícil justificar como mera brincadeira, sob algo tão forte e na maioria dos países criminoso, como aqui no Brasil. Lembram das monstruosidades do tal João de Deus, pois é... Tem uma posição do Papa Francisco, que especialmente aprecio, quando ele diz que “a hipocrisia é o medo da verdade. As pessoas preferem fingir do que ser elas mesmas. É como maquiar a alma, maquiar as atitudes, o modo de proceder: não é a verdade, mas um dia ela chega”. Não estou falando que o Dalai Lama seja um hipócrita, nem desconsiderando o seu legando de resistência do Tibete, de formal alguma, mas falo da formação falsa de um modelo que se estabelece sobre conceitos inumanos em certos líderes religiosos.
Quanto ao Dalai Lama, penso que está associado o seu gesto lamentável à senilidade de processos recalcados, que a idade avançada exibe. Não sei. Apenas um palpite, que mesmo assim não justificaria. Cria-se um reflexo falso da realidade, colocando em um patamar “superior” certas pessoas que são, como todos somos, produtos de seus traumas e histórias de vida, tendo muitos episódios inconfessáveis. E essas lideranças por ego e vaidade aceitam tal posição, afastando-se da realidade do mundo com suas demandas. Encastelam-se em suas torres artificiais, confrangendo a própria alma ao dissabor de não ser quem de fato é. O filósofo francês Durkheim já proclamava no século XIX que a religião é a manifestação de um grupo de indivíduos que compartilham a visão de mundo, unidos da mesma crença e dos mesmos pressupostos morais, os quais têm como objeto e fundamento a separação do sagrado e o profano, geralmente opostos, contudo se conectam com vias de acesso entre um e outro, inclusive secretas.
Infelizmente, muitos desses líderes abraçam a hipocrisia, levando a muitos corações a angústia da condenação, enquanto o próprio se mantém distante de suas pregações e conceitos, Enzo Bianchi, teólogo católico, bem assevera que: “A hipocrisia e a corrupção tendem, por sua natureza, a sufocar a consciência, a silenciá-la, a violentá-la em sua dimensão mais íntima. É então verdadeiro motivo de ‘escândalo’ assumir a postura de pessoa de oração e depois não amar o próximo”.
José Medrado Mestre em família pela Ucsal e fundador da Cidade da Luz medrado@cidadadaluz.com.br