Koanza, do Senegal ao Curuzu é um espetáculo de brado e sob alguma perspectiva, de dor, que busca uma revisão de valores a serem implantados, em um País de gente negra e parda, em sua grande maioria. Não se trata de reafirmação de devaneios, de uma educação corrompida por valores que deturparam, sob a égide do sincretismo religioso. Trata-se de constatações. O texto assombrosamente passado pelo seu criador, o ator Sulivã Bispo, é impecável, e ele brilha na medida precisa da sua interpretação, faz-nos rir, pensar em nossos registros. Verdadeiramente, o espetáculo começa no “hall” do teatro com as mulheres negras lindas, arrumadas com os seus cabelos em verdadeiras obras de arte. O paroxismo desse ator, que já não é mais só para a Bahia, coroa a sua performance no ato final, fazendo todo o teatro ficar calado e eu discretamente chorando. É cultura que rompe as tais práticas ensinadas de uma cultura negra do exótico e do folclórico. Não passa despercebida, no texto, a chamada de atenção para a desunião do chamado e conhecido como povo de santo, do candomblé.
Chamou-me, outrossim, a presença da diversidade, no afeto e enamorados presentes, sentindo-se acolhidos no respeito e no natural, que deve ser.
A cultura, seja na educação ou nas ciências sociais, é mais do que um conceito acadêmico. Ela diz respeito às vivências concretas dos sujeitos, à variabilidade de formas de conceber o mundo, às particularidades e semelhanças construídas pelos seres humanos ao longo do processo histórico e social. Koanza nos traz esse conceito, definido e bem objetivado. Sulivã aprofunda uma lógica aparente, clara, mas que ainda precisa ser decifrada, apreendida, para ser internalizada: sim os princípios do candomblé e os seus próprios seguidores são perseguidos, quando não, maltratados. Dessa forma, ao refletirmos sobre o que é viver em sociedade e produzir cultura, li em algum lugar: vamos compreender que na arte nasce, também, ensinamentos e despertares para o nosso entorno, em reflexão que vivemos sob a dominação de uma lógica simbólica e que as pessoas se comportam segundo as exigências dela, muitas vezes sem que disso tenham consciência.
Sem dúvida alguma, Sulivã Bispo gera a construção de uma postura política verdadeira, com momentos cômicos, mas sempre calçada não apenas na realidade, mas, talvez principalmente, na verdade que desconserta, porém necessária. A Bahia já é pequena para este rapaz, Sulivã Bispo.
José Medrado possui múltiplas faculdades mediúnicas, é conferencista espírita, tendo visitado diversos países da Europa e das Américas, cumprindo agenda periódica para divulgação da Doutrina, trabalhos de pintura mediúnica e workshops. Além disso, também escreve para o BNEWS.