A professora, doutora Ângela Caniato, que se notabilizou em sua vida acadêmica por sérias pesquisas com ex-presos políticos torturados pela ditadura militar de 1964, sempre confrontou a mentira, fazendo com que percebêssemos como ela se infiltra, passando por verdade, para ser normalizada e aceita pela sociedade. O poder de infiltração da mentira no âmago da vida dos indivíduos e em suas relações em sociedade, quando transformada em justificativa socialmente aceita, dá a permissão que um lese o outro sem culpa, afirmava. Ou seja, minta para prejudicar, mas não guarde a culpa, pois foi justificada. Há um quase consenso, aceitação e mesmo uma cumplicidade difusa na arte de dizer mentiras, quando satisfaz a grupos, sistemas, ideologias. Torna-se, sem que as pessoas se deem conta, uma violência simbolizada, onde a expressão “os fins justificam os meios”, vira estrofe de cação de ninar.
A professora Caniato, desassombradamente afirma, ainda, que a fraude se disseminou como uma espécie de norma social, a dissimulação, o enganar, o ser impostor passam a ser condição “necessária” para se conquistar benefícios de toda natureza, até mesmo religiosos, com pregadores mistificadores. Não há mais a busca por diferenciar a mentira da verdade, mas, sim, o que interessa no momento à pessoa, ou ao seu grupo. Todavia, há questões que não podemos transigir e precisamos, como há muito os mais velhos dizem: é preciso colocar os pingos nos is. Dessa forma, é que penso ser lastimável, quando um jovem político, bem versado na oratória e nas redes sociais, faz comparação com um símbolo da luta pela resistência negra, ao racismo estadunidense, Rosa Parkers, com a senhora Débora, conhecida como Débora do Baton – inclusive já se fala em ela ser candidata à deputada Federal – voltando: chega ser acintosamente desqualificada a tentativa de comparação de uma mulher que enfrentou um sistema racista, com uma que se juntou a uma turba para derrubar a democracia, cuja frase escrita com o tal batom traduzia a ideia que se tinha do seu tento. Tudo passa a ser aceito, repetido, sem qualquer juízo, nem hierarquia de valor, pois o que vale para muitos, hoje em dia, talvez a maioria, é a prevalência daquilo que penso em passar, para reforçar o que defendo, pois importante é exatamente o que penso e quero. A ver que estamos testemunhando nesses dias, e ainda com o desenvolvimento da inteligência artificial, chegará o tempo onde não distinguiremos verdade de mentira, mas de forma a não ter sequer uma réstia da dúvida do que se nos apresentará.
José Medrado possui múltiplas faculdades mediúnicas, é conferencista espírita, tendo visitado diversos países da Europa e das Américas, cumprindo agenda periódica para divulgação da Doutrina, trabalhos de pintura mediúnica e workshops, escreve para o BNEWS e o jornal atarde.